Siena Root (SP)

Texto por: Rato de Show

Fotos por: Vinicius Vieira

Agradecimentos: Abraxas, Powerline Music & Books e Tedesco Mídia


Felizes os amantes de rock progressivo, psicodelia e experimentação que, até então, têm sido muito bem servidos em 2025. Em especial a última semana, a partir do dia 30 de novembro, que contou com diversos shows na capital paulista, de nomes nacionais a internacionais, onde um que chamou atenção pela alta demanda, somada à sua distância cultural e geográfica do Ocidente, foram os japoneses do Boris, em turnê comemorativa dos 20 anos do álbum Pink, trazendo o trio nipônico pela primeira vez às nossas terras.


Em show sold out no Fabrique Club, a noite ainda contou com a estreia dos suíços do Siena Root, que realmente abraçaram o público brasileiro, não apenas com a apresentação em São Paulo, mas também com uma sessão de autógrafos na Galeria do Rock, além de um show solo no Rio de Janeiro e outro novamente em São Paulo. Promovendo seu último trabalho, Made in KuBa, uma gravação ao vivo no KuBa, renomada casa alemã, o quarteto que resgata e perpetua a estética dos anos 70 — tanto visual quanto sonora — certamente iniciou o desenvolvimento de suas “raízes” por aqui. Prova disso foi a boa lotação do La Iglesia, considerando o show que aconteceu em plena terça-feira à noite.


A abertura ficou por conta da Hammerhead Blues, trio paulista formado por Otavio Cintra (vocal/baixo), Luiz Cardim (guitarra) e Willian Paiva (bateria), em uma performance de puro feeling e daquela sonoridade que expande o nível de consciência a cada nota. Começaram com atitude com Heroes, sem palavras para descrever o impacto: o instrumental logo denunciava o calibre dos músicos — o virtuosismo passional e intenso de Luiz nos riffs e solos, o frenesi de Willian e a âncora apaziguadora de Otavio. Ao emendarem Roger’s Cannabis Confusion, o público já estava devidamente sentado em seus assentos metafóricos, fivelas presas, só aguardando a viagem prosseguir.

hammerhead blues em SP

Um som extremamente lisérgico, analógico no sentido mais visceral daquilo que se é feito ali, na carne e no osso. Se fosse para colocar em palavras, a sensação era a de sermos grãos de areia em uma ampulheta: fluindo lentamente em seu trajeto natural, mas dentro de um caos organizado.


Trazendo uma boa mescla dos álbuns Caravan of Light (2017) e After the Storm (2024), o movimento letárgico das cabeças indo para frente e para trás era a maior prova social do acerto do trio. Impossível não destacar a parte final do set, com Drifter e Thrill of the Moonrise, que trouxe os momentos mais intensos da noite — desde Luiz fazendo um dos solos mais distorcidos e incendiários, até Willian marretando a bateria com tanta voracidade que a própria caixa de som ao seu lado dava pequenos “pulos”. Um turbilhão animalesco de ritmo que arrancou aplausos ensurdecedores, inclusive de Love Forsberg, baterista do Siena Root.


Sem dúvida, uma abertura que colocou a barra da noite lá em cima, deixando todos mais que prontos para a baldeação sonora antes da próxima viagem.

hammerhead blues em SP

E não tardou para Johan Borgström (guitarra), Love Forsberg (bateria), Sam Riffer (baixo) e Zubaida Solid (órgãos e vocal) subirem ao palco, abrindo com a estonteante  e instrumental  We (Over The Mountains), do álbum de estreia Different Realities (2009), seguida por Tales of Independence (A Dream of Lasting Peace, 2017).


Assim como com o Hammerhead, foi o tipo de impacto inicial que denuncia, já nos primeiros compassos, não só a premissa, mas o nível de entrega que o quarteto teria ao longo do set. Um convite imediato a paisagens que contemplavam todas as paletas de cores, estações do ano e sentimentos humanos.


Zubaida foi, sem sombra de dúvidas, a figura mais distinta do grupo já nos primeiros segundos: personalidade forte, chamativa e absolutamente selvagem, no sentido de uma fluidez de ser que só pode ser descrita como liberdade pura. Isso aparecia desde o ato de tirar os sapatos, ao modo como balançava seus longos cabelos atrás do órgão, até correr pelo palco pequeno do La Iglesia, pulando e dançando de maneira quase pueril.


Movimentos esses que ganhavam contornos ainda mais fascinantes quando somados à sua voz — encorpada, forte, expressiva — que, aliada às suas expressões faciais, corporificava a identidade do rock setentista sem esforço algum.


E isso, claro, só é possível com grandes músicos sustentando a estrutura das diversas camadas propostas: Sam, com seu visual que lembrava bastante uma versão mais velha do Thiago Cruz da banda Pesta, conduzindo o baixo com pura diversão; Johan, entregando riffs metalizados e cativantes; e Love, que parecia responder ao solo destrutivo de Willian com a própria demonstração de força, como quem quisse mostrar todos que também é um monstro atrás da bateria.

siena root em SP

A energia do quarteto simplesmente preenchia o La Iglesia, à medida que o público se colocava a dançar, balançar os corpos ou cantar seus trechos favoritos enquanto registrava tudo em seus celulares. A banda não era das mais conversadoras, mas sempre trazia uma palavra breve,  nem que fosse arriscar um simpático “Obrigado”.


O repertório percorreu todas as fases do Siena Root, reforçando a versatilidade de Zubaida ao interpretar com autoridade tanto faixas originalmente cantadas por vocais masculinos quanto femininos. De A New Day Dawning (2004) ao recente Revelations (2023), passando por músicas explosivas como Root Rock Pioneers, com solos intensos, até faixas mais dramáticas como Keeper of the Flame, ou ainda canções mais “marvadas” como Wishing for More. O curioso era ver, entre cabelos brancos e escuros, o quanto a energia setentista simplesmente impregnava a atmosfera, perpassando gerações.


O público clamou tanto pela banda que, mesmo após o fim do set, dois encores vieram: Outlander e Waiting for the Sun, encerrando de forma magistral uma viagem atemporal pela psicodelia musical do Siena Root.

A passagem dos músicos pode até ter passado despercebida por muitos, mas para quem gosta de um som explosivo, energético e passional, é uma banda impossível de ignorar. E considerando o carinho com que trataram o país — e a recepção calorosa recebida —, dificilmente será a última vez que veremos o quarteto sueco por aqui. Fica a expectativa por um retorno breve, para que possamos novamente experimentar toda essa energia.

siena root em SP

Hammerhead Blues - setlist:

  1. Hero / Roger's Cannabis Confusion
  2. Age of Void
  3. Traveller
  4. Windmill´s Kiss
  5. Moontale
  6. Around Th Sun
  7. Drifter
  8. Thrill of The Moonrise

Siena Root - setlist:

  1. We (Over the Mountains)
  2. Tales of Independence
  3. Organic Intelligence
  4. There and Back Again
  5. Dusty Roads
  6. Into the Woods
  7. Keeper of the Flame
  8. Above the Trees
  9. Wishing for More
  10. Time Will Tell
  11. Coming Home
  12. Imaginary Borders
  13. Root Rock Pioneers
  14. Outlander
  15. Waiting for the Sun 

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